Pra ler depois...

Primavera lá, inverno aqui, sensação agridoce e a importância do vazio

Olha o tênis secando ali atrás
O inverno começou ontem, e fez sua abertura com uma chuva daquelas. Hoje, cheio de contradição, o dia nos recebeu ensolarado com direito a céu azul e limpinho. Vai entender... eu desisti, só aproveitei o meu café e fui tomar um sol. E prestei atenção. 


Ontem, tirei um tempinho pra ler alguns blogs, dentre eles um que gosto de paixão da escrita de sua autora, Amanda, do Work Of Wart. E neste post aqui ela fala sobre a primavera, suas plantinhas mas principalmente sobre estar presente, independente da estação. Ainda deu aquele conselho sobre acompanhar, observar a vida acontecer no dia, ouvir o silêncio. 

É engraçado como a gente lê algo e acha que causou impacto só naquele instante. Hoje de manhã mesmo, inconscientemente me peguei olhando as plantas da minha mãe no terraço e as palavras da Amanda me vieram à mente. Já faz alguns dias que venho notado e comentado com minha mãe o quanto  as plantas dela estão lindas e gostaram desse canto no terraço. A Bromélia floresceu e está amostradíssima com esses tons de laranja e lilás, os cactos estão lindíssimos e cheinhos, a rosa do deserto está prestes a nos presentear com suas flores brancas e rosas. Detalhes que colorem a vida e que só fazem sentido quando a gente para e nos lembram que: a vida também acontece sem o caos.


Nessa chuva de reflexões, eu lembrei do Studio Ghibli e da razão de gostar tanto dessas animações japonesas, que de início me causaram um certo estranhamento, que só fui entender de fato quando eu vi o seguinte vídeo:


Esse vídeo do canal EntrePlanos, deu nome a algo que eu sentia de um jeito agridoce nas animações do diretor Hayao Miyazaki mas não sabia como explicar: o movimento gratuito nas obras dele. O vazio. Nada considerado produtivo para o nosso mundo caótico acontecia em algumas cenas, mas ali, à espera de um olhar atento de algum personagem a vida se manifestava. Na paisagem. Num suspiro. O tempo passava, mas sem pressa. Sem diálogos. Sem ação frenética. Apenas uma pausa na trama. 

O Miyazaki diz que a palavra em japonês pra esse movimento é "Ma", que é literalmente "vazio". E esse vazio, de acordo com o vídeo, está lá intencionalmente (eu não esperaria menos do diretor). Eu recomendo fortemente você ver o vídeo para entender melhor o conceito, que é lindo e o Max explica detalhada e maravilhosamente bem. Mas basicamente, é uma ausência pela qual algo se manifesta. Algo suave que só é possível longe do barulho e do caos. Essa ideia é usada na arte, como nos filmes no Miyazaki, que tem sim a ação, mas também esse equilíbrio. Está ainda, na minha vida quando eu volto da faculdade e dou sorte de vir sentada no ônibus e consigo contemplar a paisagem e ficar à sós com os meus pensamentos e meus fones de ouvido. Estava hoje de manhã no terraço, enquanto eu tomava o meu café, os raios suaves de sol batendo na minha pele e meus olhos observando plantas cheias de vida em pleno inverno. Estava lá em Estocolmo, enquanto a Amanda trocava as suas rosas de vaso e permitia o sentimento de primavera lhe preencher. 

É claro que sabemos que a contemplação, o silêncio e movimentos mais lentos são necessários. Eu mesma já falei tanto disso por aqui. Mas você lembra que eu falei mais acima de uma sensação agridoce ao ver os filmes? então... meu corpo, minha mente, estão acelerados demais. Algo em mim me pede para eu me desligar um pouco mais, sem medo do silêncio e o que me causou estranhamento era justamente esse ritmo slow de algumas cenas dos filmes. Eu, acostumada com séries e filmes ocidentais repletos de ação, me deparei com algo que me confrontou não só os gostos audiovisuais, mas acertou outros aspectos da minha vida e me disseram: "ei, você precisa ir com calma! não precisa ter medo do silêncio ou de parar. Deixe o celular descansar." 

Tenho querido o silêncio, a calma, sem medo de estar perdendo algo dentro de uma tela, mas não está sendo tão fácil ficar longe e experimentar o "Ma" sem hesitação. Passei anos me condicionando em uma rede social como o instagram, e não é do dia pra noite que eu vou simplesmente esquecer das recompensas rápidas de uma notificação, não é mesmo? Sei disso. E não tenho nenhuma conclusão. Ainda por cima percebi como é desconfortável falar em primeira pessoa sobre essa vulnerabilidade e fato: me acostumei com a pressa e com o excesso - de informação, de estímulo, de telas, etc. Mas só queria dizer que sigo resistindo e tentado e buscado esse ritmo mais equilibrado de viver. Afinal, a vida também acontece sem o caos.

Comentários

  1. Sua postagem conversou tanto comigo...! Amo contemplar, amo momentos de silêncio. Amo o movimento absoluto da natureza na quietude e no silêncio. A fotografia e a poesia me permitem essas pausas, e registram. O registro também me traz a sensação bonita depois.

    Tudo belíssimo, Liz. Obrigada por esse post!

    ResponderExcluir
  2. Muito, muito, muito obrigada, Liz! Meu olho brilhou com esse post *-* Sabe o que me chamou atenção? Quando você falou sobre os filmes de ação versus filmes mais calmos, quase parando. Filmes franceses tem esse estilo calmo/parado. Na Netflix tu encontra vários assim. Eu acho que desde que comecei a assistir filmes desse tipo, todos os outros que são mais "loucos", movimentados, com luta e efeitos especiais, não têm ressoado comigo. Não quero dizer que eles não sejam bons, ou que eu não goste mais de filmes assim. Mas... acho que estou dando uma chance para filmes mais parados e significativos.

    Teu blog tá demais! Continue!!!

    ResponderExcluir
  3. A gente se vê um tanto viciada no frenético dos dias. Às vezes fico muito agitada e a mente não consegue se desligar nunca, daí vem a necessidade de reorganizar os pensamentos e buscar descansar de fato. É um exercício que não é tão simples, porque como você disse, não vem do dia pra noite essa mudança, mas cá estamos nós buscando o conforto que nossa saúde por completo merece e precisa, não é?
    Vamo seguindo nessa, Liz <3

    Abraço pra ti,
    Any
    Poetiza-te

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. E esse desconforto pelo vazio dos filmes provavelmente já me pegou também, mesmo não lembrando claramente de momentos que tenha me ocorrido, mas quase certo que também já me incomodou esse "não está acontecendo nada". Mas sempre está, a gente é que nem sempre aprecia o suave das coisas :P

      Excluir
  4. "uma ausência pela qual algo se manifesta". meu deus, liz. que post mais lindo! tenho nem muito o que dizer além de tudo que escreveu, porque é isso. a gente vive numa correria doida e se deixa levar por ela, ás vezes é muito dificil nadar contra essa corrente. porém, sentar pra escrever aqui e pensar sobre questões como essa que colocou no post, são uma forma maravilhosa de fazer isso. além é claro, de apreciar um pouco da natureza. e as plantinhas da sua casa estão lindíssimas! já coloquei o vídeo do miyazaki aqui em outra aba pra assistir assim que terminar esse comentário e esse seu post me deixou com MUITA vontade de assistir os filmes do studio ghibli, faz tempo que quero fazer isso, vou logo colocar em prática (porque também não ando conseguindo assistir nada, talvez seja exatamente oq to precisando agora) <3

    ResponderExcluir
  5. Achei que o tênis deu originalidade pra foto haha
    Mas o blog da Amanda é uma obra de arte mesmo XD
    Tive a oportunidade de viver alguns dias de "vazio" no mês passado, e já sinto falta da sensação. Desde que voltei à minha vida normal, tem sido uma correria!

    ResponderExcluir
  6. Eu adoro esse vídeo do Entre Planos. E gosto dos filmes exatamente por isso. E pelo sr. Miyazaki conseguir transpassar tanta beleza em cenas cotidianas. Acho que por fim, um complementa o outro rs

    ResponderExcluir
  7. Post divino.
    Sabe eu acho que o que tem deixado as pessoas muito doentes (me incluo nessa lista) é justamente não conviver bem com esses vazios cotidianos, parece ser pecado parar, respirar e só observar a paisagem. Amo os filmes do Studio Ghibli e já tinha notado esses momentos, mas não entendia o que eles significavam. Grata por esse post. Beijooo.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Hey, muito obrigada por deixar o seu comentário (ele me deixa muito contente)! Faça um bom uso deste espaço, tá bom? Vamos fazer daqui uma comunidade bem linda ♡

Form for the Contact Page