Pra ler depois...

Voltando pra casa

Eu não poderia usar outra foto além dessa da borboleta dentro do ônibus
Definitivamente, fui capturada pela leitura de mulheres que correm os lobos, porque cá estou eu pra falar de um assunto que o capítulo 9 me despertou: a volta ao lar. Então, deem-me licença, meninas, porque preciso falar sobre isso.

Em síntese, o capítulo fala de como é importante voltar ao próprio lar, nossa essência, apesar da vida objetiva. Parece que quanto menos damos atenção a isso, mais nos sentimos longes de nós mesmas, e consequentemente, entristecidas e com uma sensação de sufoco. Mais uma vez vamos falar de rotina, porque é inevitável dizer o quanto ela pode ser cruel. Não sei se é bem a rotina, ou o tanto de demandas que vão se apresentando dia após dia e parecem não terminar. 

Cada uma de nós tem uma vida repleta destas demandas. Cada uma sabe onde o calo aperta. E às vezes, nós realmente amamos o que fazemos, ou a quem fazemos, ainda assim a Clarissa Pinkola, fala da necessidade em que temos de olhar para dentro de nós mesmas pra não nos tornamos prisioneiras vivendo sem direito às coisas da alma, ao silêncio, ao descanso e vazio que alimenta.

Aqui, eu gostaria de abrir um parênteses, porque pode parecer que esse é um papo que cabe apenas a pessoas privilegiadas - e me recuso a crer nisso. Nós merecemos voltar à esse lar interior. Portanto, aqui não estou me referindo necessariamente a viajar, largar tudo, ou coisa assim. Aliás, nem a autora está falando sobre isso. Inclusive, ela até comenta que não é sobre esperar, a nível de exemplo, tirar férias para enfim, ter um pouco de paz. Precisamos na nossa vida diária, ter um momento pra nós, nem que estejamos falando de poucos minutos pra nos nutrir de vida interior. Como a autora comenta, "há muitas formas de voltar ao lar. Muitas são rotineiras, algumas são sublimes". (Estés, 2018, p. 322). Mas de quanto tempo estamos falando? O ideal é que cada pessoa compreenda o que faz sentido pra ela no momento atual de sua vida. Porém, caso o que falei até aqui ainda não faça sentido pra você, bem... paciência. E saiba, que eu também te entendo. Fecha parênteses. 


Mas o que isso significa na prática? vou colocar um trecho do próprio capítulo:
Reler trechos de livros e de poemas isolados que as comoveram. Passar até mesmo alguns minutos junto a um rio, um córrego, um regato. Ficar deitada no chão numa sombra rendilhada. Ficar com quem amamos sem as crianças por perto. Sentar na varanda debulhando, tricotando ou descascando. Caminhar ou passear de carro por uma hora, em qualquer direção, e depois voltar. Apanhar qualquer ônibus, com destino desconhecido. Tocar um instrumento enquanto se ouve música. Assistir ao nascer do sol. Ir de carro até um lugar em que as luzes da cidade não prejudiquem a visão do céu noturno. Orar. Estar com uma amiga especial. Ficar sentada numa ponte com as pernas balançando no ar. Segurar um bebê no colo. Sentar-se junto a uma janela num café e escrever. Sentar-se num círculo de árvores. Secar o cabelo ao sol. Pôr as mãos num barril cheio de água da chuva. Envasar plantas, fazendo questão de enlamear muito as mãos. Contemplar a beleza, a graça, a comovente fragilidade dos seres humanos. Portanto, a volta ao lar não implica necessariamente uma árdua viagem por terra. - Estés, 2018, p. 322
Aqui, duas coisas que pensei comigo mesma: 1) você pode inventar a sua forma de voltar ao lar. De um modo que é possível e faz sentido pra você. 2) voltar ao lar é descansar de verdade. É abraçar aquele silêncio que está bem longe de telas ou ações condicionadas. 

Pra minha mãe, voltar ao lar é cuidar das próprias plantas. É inventar uma receita. É conversar com a sua melhor amiga aos sábados. Pra mim, tem sido aquelas conversas que eu consigo ter com ela logo de manhã, tomando um café. Vir aqui escrever, procurar ilustrações bonitas pra colar na parede do meu quarto, etc. 

E foi aí que eu cheguei numa conclusão: voltar ao lar foi o que me sustentou nos momentos mais caóticos da minha vida. E que conscientemente ou não, eu sempre busquei esse lugar. E acho que você também. Afinal, estamos voltando, e se estamos voltando é porque temos uma origem na qual nos distanciamos. Certa vez, numa aula sobre educação infantil, a professora comentou a capacidade que a criança tem, devido a sua ludicidade, de brincar independente do ambiente em que ela está inserida. E é real. Já vi crianças brincando em lugares chatos, improváveis e nada propícios a brincadeira. Mas a criança é o que é, ela não consegue não ser fiel a sua essência. Te convido a observar isso quando tiver uma oportunidade.

Na adolescência eu enfrentei meus momentos difíceis, e resisti aprendendo a tocar violão na internet, conhecendo novas possibilidades de viver e histórias na literatura, lendo e escrevendo em blogs, ouvindo música, cultivando a minha fé, e passando tempo com meus amigos da época de ensino médio. Recém saída da adolescência, quando eu tinha muito medo do futuro, eu segui um instinto do coração, e fui estudar canto popular por um tempo. Lá, cantei músicas da época dos meus avós (e talvez, bisavós também rs'), e entrei num coro juvenil. Usei isso profissionalmente? Não. Mas me alimentou? Muito. Na pandemia, voltei a escrever no blog, e em diários, vi filmes do Studio Ghibli e decidi que iria maratonar os livros da saga Crepúsculo, haha! Recentemente, aprendi a gostar e cultivar plantinhas, tal qual minha mãe - não na mesma intensidade - mas tenho algumas, cuido, rego e vez ou outra converso com elas, haha. E nada disso faço incrivelmente bem, gente. Mas me nutre. E só agora, eu olhei pra trás e percebi que fiz e busquei essas coisas por causa de uma necessidade da minha essência enquanto ser humano nessa sociedade do cansaço e do materialismo. 

Vou parando por aqui porque são tantas e tantas camadas a se discutir, mas... tenho certeza que você também tem esse lugar que te nutre e te faz lembrar que você é gente e está viva. Esse algo pode ser mutável ou não. Algo que pra você é fácil, ou que você queira vivenciar do zero. Ou não seja nada pra aprender, mas pra vivenciar e sentir. Te exigir 30 ou 5 minutos. A pergunta é: você tem voltado para lá?  

Comentários

  1. Eu amo rotina, por mim ficaria sempre fazendo as mesmas coisas. Não gosto muito de surpresas e imprevistos, me tiram do eixo, fico ansiosa. Nunca li esse livro, mas adorei o seu post

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  2. Nossa, Liz, que post tão necessário. Não conhecia esse livro, mas com certeza, depois de ler o seu relato, vou procurar conhecê-lo. Percebo que voltar para a minha essência também foi fundamental nos momentos mais difíceis da minha vida. Às vezes era numa contemplação da cidade enquanto viajava de ônibus até a faculdade, numa oração feita às pressas antes de dormir ou num registro feito no meu diário. E percebo que em todas as vezes que abandonei esse olhar sobre a vida e essa prática, minha ansiedade crescia e a vida ganhava um tom mais triste. Obrigada por me recordar a importância de viver num ritmo mais lento e natural.
    https://petalasdemaioblog.wordpress.com/

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