Pra ler depois...

Sobre números, aniversário e coisas que não se medem

Desenho que ganhei do filho da minha amiga ♡

Sim, eu vou começar o texto falando de Clarice mais uma vez! Percebi que me identifico com muito da sua escrita, sabe? Então vamos lá...

Terça, dia 12/10 fiz 24! Caramba! Não foi ontem que eu fiz 23? Esse ano voou. O fato é que depois dos vinte eu tenho me sentido estranha ao fazer aniversário. Uma parte de mim tem aquele sentimento de "nossa, o tempo tá correndo e isso é assustador". Você também já se sentiu assim? E é aí que entra a senhora Lispector nas minhas divagações. Outro dia li uma crônica dela de título "você é um número". Basicamente, nessa crônica ela está inconformada com o fato de que, em sua concepção, somos reduzidos à números. Na carteira de identidade, no CPF, título de eleitor etc. O seu apelo era como um grito de inconformidade e angústia: "vamos ser gente, por favor." Gente. Não um número apenas. 

Trazendo pro meu contexto, penso que a partir de um certo ponto eu comecei a atribuir grande importância pra minha idade e me reduzir a um número também. Agora é o 24. Como se eu estivesse que estar em outro lugar. Uma cobrança interna de que eu não estou usando todas as minhas forças pra ser quem eu quero ou tenho que ser. Mas oras, eu já não estou lutando por isso? Caramba, eu sei que eu estou caminhando bem!

Avançando algumas páginas do livro de crônicas, um anônimo respondeu a Clarice de um jeito que me confortou. E sei que no fundo confortou a senhora Lispector também:

E por que te preocupa com o número? Tu não vives em função do número [...], embora ele te seja necessário. Tu vives em função da palavra e do pensamento. E tu não medes as palavras e tu não contas os pensamentos. Corre em tua veia o sangue que não se soma. E a Matemática não é o essencial. Tu não precisas aprendê-la porque tu sabes mais do que ela. Porque tu amas o Belo e o Belo não se divide. É íntegro apesar de existir em várias formas. Tu caminhas em campos abertos e claros e tu sentes o que não se apalpa. Então por que te preocupar com o número que nada te traz? Deixa que o número viva e não te confundas com a sua existência pois não é ele o alimento do teu espírito. - Clarice Lispector, Todas as Crônicas, p. 436-437.

Eu nem sei muito o que dizer depois disso. É tanta angústia que eu deixo entrar no coração, e de repente ao ler uma resposta como essa eu vejo quão boba eu sou, quando me reduzo ao número. E que pensar no número, por uma perspectiva de incertezas e pessimismo me deixa ingrata e cega pra tudo aquilo que eu não posso medir e que foi - e está sendo muito bom - na minha vida. Por isso, vou aproveitar essa segunda perspectiva pra agradecer e pensar nas coisas que eu não posso contar.

Bem, o que você precisa saber é que eu nunca fui tão livre como sou hoje. Ainda que eu não tenha compreendido a dimensão da minha liberdade, eu sou livre! E agradeço por isso. Agradeço porque não apenas no último ano, mas nos outros eu venho descoberto mais a mim. Crua. Repleta de fragilidades e inseguranças nas primeiras camadas, é verdade. Porém se você tiver paciência, vai encontrar dentro de mim, sonhos, alegrias, boas memórias que eu guardo como tesouros - e traumas também. Só que este último, tem sido justamente aquele a quem tenho dito: "Não, você não me define! E você não vai dizer como eu devo ser." É doído, é um processo mas eu sei que eu tenho aprendido. 

Eu já agradeci muito pelos detalhes, pelos dias simples. Deus sabe que eu sou grata por eles. Mas a verdade é que ultimamente os dias tem sido corridos e hoje, não vou reclamar dessa correria. Ao longo dessa semana duas pessoas, em circunstâncias diferentes me disseram que no atual momento de suas vidas estão se doando, se sacrificando, a fim de algo melhor lá na frente. Algo que elas ainda não podem ver, mas que estão plantando com esforço, tempo, amor. 

Longe de mim romantizar o cansaço e seus derivados (se você me acompanha por aqui sabe o quanto eu bato na tecla contra a produtividade tóxica e ritmo frenético de viver), mas ao ouvir essas pessoas eu senti o que é fé. Eu senti que todo esforço delas vai mesmo valer a pena, e consequentemente pensei que o meu esforço também vai. Por isso, hoje eu agradeço não pelo caos, mas por ter o privilégio de poder estudar. De poder cultivar e cuidar das sementes que eu mesma escolhi, e sei que não vai ser em vão. Deus sabe.

Agradeço porque eu tenho descoberto o valor não de muitas, mas de uma amizade sincera e real. Agradeço pelo tempo, que às vezes me despedaça ao longo das estações, mas o mesmo se encarrega de me reconstruir de novo em seu mistério. Eu agradeço porque eu não sou um número e porque não quero confundir a minha existência com ele. Eu sou o amor que me ofertaram e eu aceitei. O amor que também dei. E como diria Clarice: "O amor não é um número. A amizade não é." E por essa graça, eu simplesmente agradeço e digo à mim mesma, em alto e bom som: feliz vida! 

Comentários

  1. Parabéns Liz! Muitas felicidades, saúde, sucesso. Tudo de bom!

    Aww amei o desenho. Ficou muito lindo! Você ficou muito fofa ♥

    Já faz um tempo que eu não gosto de fazer aniversário. Pra mim, essa data só me faz lembrar o quão velha e o quanto eu não fiz nada na vida rs

    Mas eu espero que você consiga aproveitar essa nova etapa da sua vida de forma leve, desapegando-se do número em si. Feliz viva pra você ♥

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    1. Meus desejos pra você são iguais ♥

      Ahh, mulher, eu tava assim... sempre coloco uma expectativa nesse dia rs'. Obrigada por tudo Clau ♥

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  2. Que texto mais incrível! Feliz vida para você!

    Boa semana!


    Jovem Jornalista
    Instagram

    Até mais, Emerson Garcia

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  3. Que lindo seu texto, Liz ♡
    Me senti verdadeiramente inspirada
    ;)

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  4. Oii, gostei muito do seu blog❤ Parabéns!! Eu amo fazer aniversários mesmo que eu esteja ficando velha rs.
    Bjs!
    https://versosquecolori.blogspot.com/?m=1

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  5. Eu também adoro a Clarice Lispector, me identifico muito com ela.
    Isso de se definir em um número é complicado e só nos causa frustração.
    "... hoje eu agradeço não pelo caos, mas por ter o privilégio de poder estudar. De poder cultivar e cuidar das sementes que eu mesma escolhi, e sei que não vai ser em vão. Deus sabe." me identifiquei bastante com esse trecho, na maioria das vezes eu duvido que meu esforço será recompensado sabe? É bem ruim, então tentar acreditar que tudo vai sim valer a pena é um conforto.
    Ótimo texto e ah, feliz aniversário mesmo que atrasado, tudo de bom sempre!! ♥

    https://www.heyimwiththeband.com.br/

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  6. Verdade, Vah! A incerteza é o que nos abala...

    Obrigada ♥♥♥

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  7. Dia desses mesmo eu estava pensando sobre essa coisa de crise de idade, sobre como um ano a mais nos deixa preocupadas e pensando em como podíamos estar fazendo mais, sendo mais. Ainda faltam alguns meses para o meu aniversário e ainda que dessa vez eu não esteja preocupada com o número, não quero que me preocupe quando chegar lá, nem antes, nem depois. Quero a leveza de saber que tenho vivido o meu melhor e que me resta muito tempo pela frente para conquistar o que quer que seja. Ainda que incerto (nada sabemos sobre o amanhã) o melhor é ir buscando respeitar nosso processo.
    Não é fácil, mas vale a pena tentar. E esse trecho que você citou fez tanto sentido, mas tanto! Que não nos limitemos aos números sem sentido.

    Abraços pra ti, Liz :)
    Any.

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